Para que facilitar se podemos complicar?
Tenho certeza de que alguém há de concordar, pelo menos em parte, com o que vou escrever hoje.
O ser humano tem a dita mania de complicar as coisas, em vez de levar a vida como ela é, sem rodeios e sem medo.
Planejamos um mundo de coisas, porque somos criados para valorizar o "ter" e não o "ser". Desde pequenos ouvimos nossos pais dizerem "não" e aprendermos a construir castelos de areia. Sem contar que somos obrigados a montar enxoval a partir dos 14 anos e aprendemos, desde cedo, a priorizar a companhia de moço(a) de família, formado(a), com uma boa conta bancária, com bom emprego, e que pelo menos estude. Para as meninas deve ser, de preferência, o tal do príncipe encantado que irá salvá-las das mãos dos bandidos.
Já os meninos aprendem que é feio, muito feio chorar, e que não devem levar desaforo para casa. Em seus currículos, desde pequenos, devem constar as brigas ganhas e as meninas que já "pegaram".
Tanto meninos quanto meninas são criados de modo a achar que o que é válido é o corpo escultural, a alta remuneração, as palavras duras que somos capazes de proferir, as respostas que ferem o outro e que já estão preparadas, na ponta da língua, para serem ditas. E quando crescem, passam a encarar a vida já com o peso da bagagem plantada em suas costas, por seus pais, pela sociedade.
Não é raro, também, filhos conviverem com pais embriagados e violentos, com mães que dedicam a maior parte do seu tempo ao trabalho e não aos filhos. Não obstante existem pais super controladores e super protetores, que acham que seus filhos poderão ficar eternamente sob suas asas.
Vocês devem perguntar:
- E daí?
Daí que, sem percebermos, iniciamos relacionamentos no trabalho, na escola, na universidade, com o(a) parceiro(a), no mínimo, pensando coisas do tipo:
1- Só tenho competência se ganhar muito dinheiro;
2- Não tenho valor porque não sou a rainha da cocada preta;
3-Tenho que emagrecer para que meu marido volte a se interessar por mim;
4-Meus filhos têm que ter a melhor nota e devem ser os melhores;
5-Meus filhos não devem se misturar com aquele menino, porque não pertence ao "nosso mundo";
5-Mulher pra mim tem que se magra, ter um belo par de seios e bunda grande, e também fazer um bom sexo;
6-Homem pra mim tem que fazer tudo o que eu quiser, não vai ficar num bar com um monte de machos, em vez de ficar grudado em mim 24 horas;
7-Não fui criado para me casar;
8-Ele me tratava como uma rainha e hoje nem liga para mim;
9-Meu chefe vai odiar o trabalho que fiz;
10-Será que vou agradar? Será que fiz tudo direito?
Bom, eu passaria um dia inteiro citando as neuras pessoais que enfrentamos diariamente e que nos levam a conduzir o nosso relacionamento com o outro deforma equivocada. Infelizmente, a maior parte dessas neuras são elementos arraigados na nossa cultura, que nos acompanham desde que nascemos.
Crescemos e somos impelidos a nos proteger, de alguma maneira, de tudo aquilo que nos deparamos quando éramos pequenos e que não conseguimos superar. Transferimos a carência, o medo, a obrigação para as drogas, para a obsessão de sermos infalíveis, para a incapacidade de amar, para o fato de amarmos demais, para a competência desleal, etc.
Criamos mil e uma justificativas para explicar o inexplicável. Criamos expectativas a respeito dos outros. Pré julgamos. Julgamos. Tememos. Queremos. Deixamos a criança em nós, mimada, medrosa aparecer em determinados momentos, mas nem nos damos conta disto, por causa da correria dos dias atuais e, sobretudo, porque temos medo de olhar para nós mesmos.
E a consequência é desastrosa: o emprego que começou bem, passou a ser instável; o casamento que tinha tudo para dar certo está uma porcaria; a sua casa está cheia de baratas, a sua alma em frangalhos; seus filhos não lhe respeitam; seu salário é uma porcaria, sua vida, idém; você tem medo de andar com o celular na bolsa e dorme com seus filhos, criando crianças medrosas.
Realmente: para que facilitar se podemos complicar? Para que melhorar se podemos piorar?
Alessandra Grisolia, jornalista
Fala Alê, tudo joia? Aodrei esse seu texto, é a sua cara. Abração
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